Ciclo
12
Eles se conheceram pela Internet em uma tarde qualquer de março quando perguntas sem respostas dominavam a mente dos dois. Ela o chamou na sala de bate-papo simplesmente porque achava bonito o seu nome. E ele aceitou de imediato conversar com aquela estranha tão interessante e atrevida.
A conversa durou horas naquele primeiro dia. Ele contou a ela que acabara de passar por um grande trauma físico e ela não escondeu dele que ainda sentia os efeitos de um grande baque emocional.
As suas dores se juntaram diante da tela daquele computador numa terapia que era traduzida em letras coloridas que preenchiam mais e mais painéis enquanto eles conversavam.
Em abril ele já falara com ela sobre a alegria angustiada que sentia com a chegada de um presente do destino e ela já lhe contara do medo que sentia por, talvez, jamais encontrar o verdadeiro amor.
No mês de maio os ares do sul e do sudeste começaram a esfriar com a chegada próxima do inverno e, talvez pelo fato de se descobrirem capazes de aquecer um ao outro, eles se julgaram apaixonados.
Mas era tudo alucinação de suas mentes ainda doloridas. E essa alucinação trouxe a cobrança, o ciúme, a discussões e a separação. Por isso os meses de junho e julho foram ainda mais frios do que o próprio inverno.
O menino sentia a falta dela. E para a menina era triste olhar aquela tela nua todo final de tarde. Mas o mês de agosto encheu o céu de pipas coloridas e ouso dizer que é certo que todas aquelas cores lhes tenham iluminado os corações.
Por tudo isso, quando em setembro veio a primavera, aquela tela outrora nua, encheu-se novamente de risadas e relatos diários traduzidos em símbolos de todos os jeitos.
Foi promovida no trabalho. Ele recebeu visitas indesejadas, mas encontrou uma nova maneira de caminhar. E ela tudo contou para ele. E ele nada escondeu dela.
A distância não impediu seus pensamentos de conversarem durante todo o tempo. Então, quando no mês de novembro ela seguiu em um ônibus para ser examinada por contrastes doloridos, ele segurou sua mão através da tela de um celular.
Mas foi na noite de Natal que ele surpreendeu-se pensando nela enquanto a chuva batia na vidraça. E foi na virada de ano que ela sorriu misteriosa ao perceber que os fogos de artifício tinham o mesmo brilho que ela vira nos olhos azuis dele através da fotografia.
As férias de janeiro desaceleraram o tempo e as tardes foram preenchidas por confissões sentimentais regadas a risadas que os embriagavam docemente como se fossem vinho.
Porém, após o Carnaval, eles perceberam que até o efeito do vinho mais forte um dia se esvai do corpo e que aquilo que eles sentiam um pelo outro, não era uma dessas fantasias que a gente encontra em festas de salões e ruas. Era algo muito mais forte e muito mais doce que qualquer vinho. Era um sentimento que fora crescendo aos poucos e, como água, fora invadindo suas vidas, suas mentes. Era algo que preencheu o coração da menina e do menino de uma alegria tão grande que já não podia mais ser contida.
Agora outro ciclo começaria. Cheio de sonhos e incertezas. Cheio de medo e esperança. Um novo ciclo que, naquele momento, dava ao menino e à menina somente uma certeza: a certeza de que, não importando o acontecesse dali pra frente, eles seriam pra sempre um do outro.